domingo, 16 de maio de 2010

Desembarque

Praga, 15 de maio de 2010.
0h30.
O trem mal parara na plataforma e já se via um vulto saltando do último vagão. Em contraste com a pressa para sair da locomotiva, a passageira andava lentamente, ao passo que os poucos companheiros de viagem desembarcavam e iam em busca de descanso.
Todos se foram, mas a viajante continuava ali, vagando sem rumo. Àquelas horas a estação estava praticamente vazia, contando apenas com um guarda noturno que nem notara o ser caminhando lentamente pelo local.
Mechas de cabelo loiro emolduravam o rosto em que se destacavam olhos verdes e ariscos. Apesar da aura de mistério que parecia envolvê-la, ela não era estranha à cidade, pelo contrário. A jovem nascera e vivera lá por anos. Agora, após mais de um ano sumida, ela retornara com a intenção de retomar sua vida da melhor maneira possível.
Varria a paisagem à sua frente com aquele olhar enigmático que só ela tinha. Não esperava ver alguém esperando ansiosamente pela sua chegada. Ninguém cria na volta da garota após tanto tempo sem notícias; ela tampouco avisara os poucos que souberam de sua partida de que tomaria tal trem.
Contudo, ela gostava das coisas assim, espontâneas. Partiu sem aviso prévio ou justificativas numa espécie de autoexílio.
Meses antes, inúmeros acontecimentos haviam transformado sua vida de uma hora para a outra. Atordoada, ela buscou um modo de organizar sua cabeça, seu interior, e o melhor que encontrou foi o isolamento.
Tornou-se incomunicável, visitando os mais variados lugares. Enquanto passava por ambientes tão distintos entre si, organizava seus pensamentos e adquiria novos conhecimentos e aprendizados. Ao mesmo tempo, esquecia aquilo que não lhe tinha mais utilidade alguma.
O caminho que escolheu foi o mais esclarecedor possível. Ironia ou não, quanto mais se perdia pelos caminhos exteriores, mais se encontrava nos interiores. Aos poucos, recuperou sua essência e reaprendeu a viver. Foi um processo lento e em alguns momentos até mesmo doloroso, cheio de escolhas que resultaram em mais mudanças.
Escolher é sempre difícil, mudar ainda mais. Todavia, às vezes é preciso deixar pra trás para que se possa seguir. Assim que a jovem errante percebeu isso, ela se encontrou e pode arriscar um retorno.
Agora lá estava ela. Pronta para reatar antigos laços, reaprender a se relacionar. Ela mudara e com certeza as pessoas que permaneceram na cidade também. Seria mais um longo processo, uma sequência de tentativas.
Porventura, algumas dessas tentativas seriam frustadas e não teriam o resultado esperado, o que não significaria que deram errado.
Anastasia era teimosa, persistente. Embora tenha mudado em muitos pontos, sua força de vontade ainda era a mesma. Cheia de esperanças e revigorada, ela estava pronta para dar o seu melhor em busca da felicidade.


*Anastasia: do grego, a que voltará novamente, da ressurreição.

2 comentários:

JC disse...

É impressão minha ou vc está para Rep. Tcheca assim como eu estou para a Inglaterra?? hahaha

.Amandinha* disse...

Sou apaixonada pela República Tcheca *-*