sábado, 8 de agosto de 2009

A Visita

Passos no corredor assustaram-na. Acostumara-se a ouvir somente o som da própria respiração. Barulhos que não fossem provocados por ela mesma eram estranhos, soavam como fruto da própria imaginação ou uma vaga lembrança de um passado não tão antigo assim.
Pôs-se em guarda sem saber de onde vieram aqueles passos. Quem estaria andando por lá a essa altura? Quem descobrira aquele obscuro corredor? Tinha certeza de que apagara as luzes que conduziam qualquer um até lá meses antes. Prova disso era a falta de visitas. Mas isso não a incomodava. Tanto fazia alguém aparecer por ali ou não. Era até melhor.
Os passos pareceram ficar ainda mais próximos. Encolheu-se num canto bem a tempo de ouvir batidas na porta. Ora, fosse quem fosse logo veria a escuridão lá dentro e decidiria por ir embora.

Mais batidas. A curiosidade era grande e ela decidiu olhar pelo olho mágico e descobrir quem era o misterioso visitante. Um estranho provavelmente, nenhum conhecido se atrevia a enfrentar aquela escuridão para vê-la.
Soou a campainha. A insistência instigou-a. Talvez fosse bom abrir uma fresta pra ver o que a pessoa queria. Ao mesmo tempo saciaria sua imensa curiosidade e descobriria quem era.
Tentou falar para a pessoa esperar um momento, mas a falta de costume no uso da voz não permitiu um aviso. Ao invés disso apenas um sussurro tímido saiu de sua garganta, dito mais para si mesma do que para os outros. Idiota, ele não vai ouvi-la nesse tom.
Risos vieram de fora. Ele ouvira não só o sussuro, mas também o xingamento que ela imaginava ter apenas pensado. Boba. Qual o problema de ter alguém na porta? Simplesmente abra!
Mais risos, dessa vez mais audíveis. E algo foi dito lá fora. Já não está na hora de abrir essa porta e as janelas para o sol entrar?
Um pouco de medo tomou conta da moradora. Que aconteceria ao abrir a porta? Seria seguro? E as cortinas pareciam tão pesadas, conseguiria abri-las sozinha?
É por isso que estou aqui, pestinha. É mais fácil do que você pode imaginar, não precisa ter medo.

Pestinha. Ela tinha esquecido de como era ser chamada por um apelido carinhoso. O que era aquilo que ela estava sentindo dentro dela? Estaria passando mal? Seu coração estava acelerado, suas mãos tremiam e sentia uma leveza dentro de si, como se borboletas voassem em seu estômago. Como era mesmo o nome que davam a essas borboletas?
Frio na barriga. Risos, agora não só de fora.
Há quanto tempo não ria? É verdade, frio na barriga. Nome estranho pra se dar a essa sensação. Ela parecia lembrar aos poucos do que vivera. Parecia ter passado tanto tempo... O silêncio é realmente traiçoeiro, engana a todos. Segundos viram minutos e horas parecem segundos de acordo com o silêncio em que se vive.
Então?
Ele não era mais um estranho. Havia uma ligação mais forte e inexplicável entre visitante e moradora. Ela olhou para a porta em uma última reflexão. Realmente, já é mais do que tempo de abrir aquela porta e ver o pôr-do-sol novamente.
Onde deixara a chave?

2 comentários:

Lorenzo Tozzi Evola disse...

penso que, mais do que apenas jogar a culpa em outra pessoa ou entidade, talvez tal expressão sirva como um desabafo.

***

esse texto ainda é dos antigos, ou você o escreveu recementente? digo isso, porque é notável a evolução que está ocorrendo em sua escrita. esse texto, para mim, é o melhor desse blog até agora; não sei, no entanto, se é coincidência.

:*

mari disse...

Realmente, o menino de cima falou bem em nomear esse texto como o melhor.


A chave vc já deve por ter achado o/

admire sempre e da melhor forma o por do sol, pra no tempo que irá descorrer ao próximo vc ter boas lembraças!

Sejaaa feliizz
é o mais importaantee

=DD